sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Mar de amar



Vem e te espalha em meu corpo...
Bem devagar...

Vem e me navega
Tu és barco e eu sou mar...

Quando a onda aterrissar
Chegarei ao céu...

E voltarei barco
Para que também possas ser mar...

- Bianca Velloso -

Insônia 2



Quatro horas da manhã
Acordo e escrevo
Para fugir da ansiedade
Fabricar poesia
no meio da madrugada
A poesia não tem hora
Tem que ser agora:
bate no peito em desatino
E sai pelo mundo afora...

- Bianca Velloso -

Música para ouvir



A faca que abriu a ferida
Chegou foi via celular
No momento em que 
A guria dirigia...

Depois de desligar 
ligou o rádio com pressa
- compressa -
para o sangramento estancar:

"Canta, Arnaldo Antunes
Canta bem forte que preciso muito de ti
Canta que teu canto acaricia e acalenta!"

"Música para ouvir"
Música que entra pelos poros
Atravessa o corpo e a alma e vai além...

- Bianca Velloso -

Gangorra de Dois

Quem foi que disse que o erotismo precisa ser obsceno?
Afrodite fica eriçada de verdade é com lirismo
O sexo rende-se facilmente a metáforas
Não são necessárias palavras difíceis
O belo é exatamente o simples:
Gangorra de dois

- Bianca Velloso -


quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Pai

De todas as feridas que traz na alma, existe uma - apenas uma - que de vez em quando ainda sangra. As outras - talvez nem sejam tantas - já cicatrizaram tão bem que lhe ajudam a compor o caráter e equilibrar o temperamento. Usando as palavras, como se linha e agulha fossem, ela tenta suturar a ferida que neste momento encontra-se aberta. Esta ferida tem um nome curto, apenas três letras, mas é tão profunda que pode lhe causar hemorragia... A ferida chama-se Pai...

Tudo bem que ele refizesse sua vida e tivesse outros filhos... Tudo bem que ele não pudesse - ou não quisesse - colaborar financeiramente...  Tudo bem que ele lhe tirasse a casa... O mundo material não era o mais importante, além do mais a falta deste tipo de apoio fez com que ela aprendesse a caminhar com as próprias pernas... Tudo bem que não comungassem dos mesmos ideais... Tudo bem que ele não fosse visitá-la... Ela só queria estar perto e contentava-se com migalhas de afeto...

Há dezessete anos, ela era uma menina metida a revolucionária e poeta. Foi trabalhar com o pai, num centro de adaptação de lentes de contato. A ideia era que trabalhasse apenas durante as férias da faculdade, pois considerava a atividade muito técnica e muito comercial. Ela queria trabalhar com gente, acreditava que poderia mudar o mundo e que o caminho da mudança era a educação, por isso cursava pedagogia. Acabou percebendo que trabalhar com a visão era também poder olhar de perto para as pessoas, e que para mudar o mundo poderia começar pela transformação do olhar...

Para além de toda essa percepção, estar ali naquele meio era estar perto do pai, o homem que ela ainda acreditava merecer o título de heroi.

Quando resolveu aprofundar-se nos estudos e mergulhar no universo das lentes, ele disse que não poderia acompanhá-la... Quem ficou ao seu lado foi a mãe... Mesmo assim ela não desistia de estar perto dele...

Formada em Optometria, enfrentando uma briga ferrenha com os oftalmologistas, lutando para trabalhar, trabalhando com afinco, conquistando espaços entre os integrantes do ramo, ela já estava acostumada a manter com ele uma relação de parente distante... Um dia ele resolveu sondá-la, chegou até a propor parceria... A filha, já não mais tão menina, animou-se, viu novamente a oportunidade de estar perto do pai... Finalmente ele estava reconhecendo seu trabalho, seu valor...

Para seu grande espanto, de repente, descobriu que aquela proposta já não existia, que aquela parceria já estava acontecendo e não era sua... O pai aliou-se a uma oftalmologista... Porta fechada, ferida aberta... Sangrando... O que se pode esperar de um pai que nunca foi pai? A menina-mulher já não quer mais esperar de quem não pode dar afeto... E segue o rumo carregando os mesmos ideiais poéticos e revolucionários de outrora... Talvez ela não possa mudar o pai, mas quem sabe se mudar o mundo - através do olhar e da poesia - a alma não cicatriza um dia?

- Bianca Velloso -

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Palavra



Palavra não é entendimento
mas pode ser carinho,
adorno e brincadeira

Palavra pode ser poesia
Mas nunca essência!

Palavra é expressão!
E pode fazer toda a diferença
em nossos sonhos de amor!

Tuas palavras me envolvem,
 acariciam e são ninho:
acalentam o coraçãozinho

Mas, menino, as tuas mãos,
os teus acordes sussurados
o teu sorriso e o teu olhar
tocam-me de um jeito
que palavra nenhuma pode expressar!

- Bianca Velloso - 

Oração de Poeta



Que nossas palavras 
tenham sempre asas
que sejam leves
que sejam carinho
que sejam brinquedos
que sejam fonte de poesia
que sejam alimento
que sejam fogo...
Que sejam mar
onde o amor possa navegar!
- Bianca Velloso -


segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Religião - (re)ligare



Os deuses nascem dos sonhos da gente
Tem gente que gosta de sonho de padaria
Eu prefiro sonhar meus próprios deuses

Descobri, num desses sonhos caseirinhos,
Que a gente nasce dos sonhos dos deuses
E os deuses sonham sonhos de amor

- Bianca Velloso -



Mais um episódio dos sonhos de Helena



- Meu sonho é tocar na lua, para ver se ela é mole ou dura!
- Hummm... E como achas que ela é?
- Eu? Hummm... Acho que ela é molinha... Se a gente tocá-la, ela cai, "puf"...

- Bianca Velloso -

Sempre



Como se fosse sempre antes, 
como se fosse sempre SEMPRE! 
Eu te sinto tão forte em mim 
que é mesmo como se sempre 
estivéssemos aqui! 
Respiro os teus sons 
e me embriago com teus acordes! 
Teu cheiro me inunda a alma! 
Meu coração transborda de amor 
e meu corpo incendeia de desejo!

- Bianca Velloso -

O poeta e suas namoradas - para Uby Oliveira

 

Ele namorava a vida,
apaixonado, derretia-se e
se declarava em versos...
Mas de vez em quando ela tropeçava
e o traía...
E como doía...
Num desses tropeços
a existência ficou por demais pesada...
Ele resolveu, então, flertar com a morte:
Premeditou a viagem
e embarcou aninhado nos braços
da nova namorada
- a morte não trai.
Hoje ele é canto de pássaro
dança de vento
e luz de poesia...

- Bianca Velloso -

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Um texto escrito com dor



"Um sistema de desvínculo: Boi sozinho se lambe melhor.. O próximo, o outro, não é seu irmão, nem seu amante. O outro é um competidor, um inimigo, um obstáculo a ser vencido ou uma coisa a ser usada. O sistema, que não dá de comer, tampouco da de amar: condena muitos à fome de pão e muitos mais à fome de abraços." - Eduardo Galeano no "Livro dos Abraços"

Ah, essa fome de abraços a que estamos todos condenados! O sistema alimenta o medo e do medo nasce a fome de abraços! Sinto-me triste, envergonhada e impotente... E por mais que tente lutar contra o sistema, também trago em mim o medo e a fome de abraços...

Madrugada de sábado para domingo, voltava para casa de carro com meu gato depois de ter curtido a festa de carnaval. O caos instalado em Florianópolis: não havia transporte público na cidade porque o crime organizado - muito mais organizado que o governo - estava incendiando ônibus em todo estado. Na beira da estrada, lomba acima, uma senhora pedia carona. Afrontando o medo, paramos.

Dona Arlete voltava a pé - dezesseis quilômetros - depois de ter trabalhado até de madrugada servindo à festa da pequena burguesia. Embriagadas, as pessoas que lucraram com o trabalho de Dona Arlete continuaram festejando. Disseram-lhe que voltasse no dia seguinte para receber o combinado e largaram-lhe porta a fora, sem dinheiro e sem transporte...

O destino de Dona Arlete não era no nosso caminho de casa, mas isso pouco importava. Quando ela desembarcou, no pé do Morro da Caixa,  ficamos em silêncio, forma de acolher a dor, a impotência, o desconforto, a tristeza, a culpa e a inocência... Estamos de mãos atadas...

E enquanto isso, o caos aumenta: maior o desvínculo, o medo e a fome de abraços...

- Bianca Velloso -






sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Descobertas...



Ah, este olhar de espanto, de encantamento, fonte de toda a poesia! Ontem Helena me explicou:

- Mãe, o mar é só espuma! Quando chega na praia é que se transforma em água!


- Bianca Velloso -

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Mãe



Muito mais do que no espelho
Quando olho para dentro de mim mesma
Percebo que há tanto de ti...
Tuas pegadas ainda me guiam
Mesmo que eu já tenha
 me apropriado do caminho
- estradas que tu abriste -
que me ensinaste a trilhar:
uma rua chamada Simplicidade
Na bagagem só leveza:
Voo livre, carinho, igualdade
e a imaterialidade.

- Bianca Velloso - 

Sonho

 Tela: Mon Shon - Marianne Milar

Não acredito em certezas
Acredito em sonhos
As certezas são finitas
Os sonhos não têm fim
És pra mim um sonho
Que se tornou realidade
Sem deixar de ser sonho
És todo meu lirismo
Toda minha liberdade
Meu voo de amor

- Bianca Velloso -

Encontro

Tela: Fun in the Sun II - Alfred Gockel

As almas brotam de pequenos planetas
E cada planeta é um sonho de Deus...
Por certo somos almas oriundas
Do mesmo sonho de amor

Entre a gente não são necessários acordos
- nem palavras - só acordes

Olhares que se encontram
Acasos que se amarram
Mãos que se unem

És pra mim muito mais que namorado
és cúmplice e companheiro,
parceiro de devaneios

Teus olhos têm cor de poesia
Tua boca tem gosto de música

- Bianca Velloso -


sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Convite



Gato, vem comigo!
Vem brincar de inventar vida
musicar os nossos sonhos
- com solos de saxofone -
vem voar nas asas da poesia!

- Bianca Velloso -

O homem que acende estrelas



O Homem-Menino
acende estrelas,
tece notas douradas
em meu corpo
e desenha versos coloridos
em minh'alma...
É sol, chuva fina, arco-íris
E vulcão em erupção!

- Bianca Velloso -

Juliana


Sonhei mais um deusinho:
O deus que entrega anjinhos
- se parece um pouco com São Longuinho -
Eis que colocou em meu caminho
uma menina espevitada, um docinho
Ela carrega muitos sonhos nos olhinhos
E é um poço de ternura e de carinho!

- Bianca Velloso -

A Holanda da minha infância



 A casa da Holanda era colorida 
de travessura e fantasia
pega-pega, esconde-esconde
 de estourar sementes
de maria-sem-vergonha
desenterrar tatu-bolinha
biscoitinhos de maisena
o feijão sempre fresquinho
os bordados em ponto-cruz
as mãos mágicas da Vó Ora
a encantadora boca do Vô Paulo...
A Holanda da minha infância
não era um país
era apenas uma rua
Na memória muito mais que um continente

- Bianca Velloso -



sábado, 2 de fevereiro de 2013

Voejando



Na beira do mar
olhamos para o céu:
as estrelas caminhavam
sobre nossas cabeças...
Estávamos voando:
Voando no universo do amor...

- Bianca Velloso -

Bom dia!



O despertador tocou às seis da manhã... 
O sono estava tão bom... 
Eu não queria levantar... 
Ainda não... 
Precisava atravessar a ilha dali a pouco, 
mas daria para dormir mais um bocadinho, 
meia horinha... 
Reprogramei o relógio, 
meio dormindo, meio acordada... 
Fechei novamente os olhos... 
E o que me veio? 
Esta imagem! 
A música deixando de ser apenas partitura, 
ganhando vida, 
ganhando o espaço, 
ganhando cores, 
ganhando o amor! 
Eu precisava escrever! 
Levantei! 
Bom dia!

- Bianca Velloso - 

Metáforas




O sexo é belo e poético pelo que é
simples assim: 
tempestade de estrelas
semente de sol
terremoto de flores
explosão multicor
intensidade
entrega total
liberdade
para tocar e ser tocada
do fogo à seiva
do gozo à alma
"A Pequena Morte"
Voo pássaro
"O Sempre Abraço"

- Bianca Velloso -

A cor do olhar



Passo os dias
Examinando olhares
Olhos de todas as cores
Que carregam dores
E sonham amores
Mas o meu olhar
Tudo o que quer
É enxergar sua cor
Refletida nos olhos doces
Do Homem-Menino-Amor!

- Bianca Velloso -

Fogueira



Como pode ser feio 
O fogo que é a semente da vida?

- Bianca Velloso -

Guimarães Rosa



Era outubro... Estava eu na livraria, indecisa entre dois livros: "Primeiras Estórias", do Guimarães Rosa e um outro livro qualquer que agora já nem lembro mais qual era... Nunca tinha lido nenhuma obra do Guimarães Rosa, só coisas soltas, um pouquinho aqui outro ali, citações nos livros do Rubem Alves, frases perdidas na internet... Parou do meu lado um rapaz e, percebendo minha indecisão, resolveu palpitar:

- Estás em dúvida sobre qual livro levar?

- Sim... Se pudesse levaria os dois, mas estou contendo os gastos...

- Posso dar uma opinião?

- Pode...

- Não leva esse Guimarães Rosa, eu li quando ia prestar vestibular... É assim, tipo... Bom, eu li e fiquei me perguntando, tipo: tá e o que ele quis dizer com isso?!

Ah, pra quê? Quando ele me veio com essa, de pronto decidi: É esse Guimarães Rosa mesmo que vou levar! Ali tive absoluta clareza de que me apaixonaria pelo livro! Estava terminando de ler "Eva Luna", da Isabel Allende e tinha uns outros livros para serem lidos na sequência... Só agora é que consegui chegar nas "Primeiras Estórias". E de fato, estou completamente apaixonada! Colo o nariz no livro, passo o rosto entre as folhas, aperto-o contra o peito... O livro é de uma delicadeza infinta! Que diabos esse povo tem de achar que um autor precisa querer dizer alguma coisa? O autor tem que dizer e pronto! Cabe a nós, leitores, apenas sentir, não tentar encontrar algum sentido!

- Bianca Velloso -