Trinta e um de dezembro.
Fim de tarde. Luz amena. À beira da Lagoa ela pedia carona. Não costumo dar
caronas, mas naquele dia parei.
- Oi. Tudo bem? Entra. Para onde
vais?
- Minha filha está parindo. Podes
me levar até o HU?
- Posso sim. Fica tranquila.
Vamos até lá.
Fizemos o trajeto todo em
silêncio, não perguntei seu nome, nem ela o meu, mas nos reconhecíamos amigas desde
há muito tempo. E o tempo estava ali. Um tempo imemoriável, um tempo sólido de
um pretérito não vivido, mas sabido.
Esqueci que dia era, esqueci os
compromissos familiares, esqueci o trânsito caótico da data. O bebê nasceu. Era
uma menina. Maria. Parabenizei a mãe, dei boas vindas à criança, abracei forte
a avó. Os foguetes logo me fizeram lembrar que eu precisava seguir.
Despedimo-nos.
O ano novo começou. E passou. Com
as habituais alegrias e tristezas que compõem a vida.
No ano seguinte, na mesma data, sem prévia combinação, tornamos a nos encontrar na beira de um rio sereno,
margeado de flores brancas. E era tamanha a obviedade daquele encontro que não
nos perguntamos nada, apenas nos abraçamos. Eu com minha família, ela com a
dela.
- Esta é Maria? Que linda está!
Posso segurá-la um pouco?
Tomei a menina nos braços. Minha
mãe aproximou-se caminhando lentamente e falou com voz suave:
- Agora eu entendi o teu jeito de
ver a vida.
- O meu jeito de ver a vida? E
como é meu jeito de ver a vida, que nem eu sei?
- Pega aquela flor ali que
entenderás. – e continuou o caminhar.
(Bianca Velloso)
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